quarta-feira, 19 de maio de 2021

Dorsal Atlântica – “Pandemia”

(2021 – Nacional)

 

Independente

 


Toda era, cena ou movimento musical tem sua marca ou seu “rosto”. Independente de estilos, sempre há artistas que, de certa forma, delimitam as características artísticas de um movimento. O Rock e seus derivados não fogem à regra.

Quando se é adolescente, principalmente, a identificação, em um primeiro momento, vem na forma de ritmos e melodias. Tal padrão era facilmente identificado nos anos 80. Nem todos tinham acesso a traduções ou o domínio da língua inglesa. Ainda não havia “internet” e todas as facilidades para descobrir as “mensagens” nas letras. Tinha de se virar com dicionário, algumas poucas revistas ou contar com a bondade de alguém (risos).

O importante – no caso do Metal, em especial – eram o peso, a agressividade e as melodias vocais. O Black Sabbath com o Dio era a expressão mais pura do Metal tradicional. O Exodus representava a fúria do Thrash Metal. O Mötley Crue o Hair Metal. São escolhas aleatórias e pessoais, claro. Apenas exemplos de “identificação e/ou identidade”.

E no Brasil? A mesma situação. De um lado bandas cantando em inglês; do outro, em português.  No entanto, a narrativa lírica tinha muito mais a ver com o universo europeu e estadunidense que com a “nossa” história. Exceção ao Movimento Punk, pouquíssimas bandas abordavam temas sociais e históricos.

Independentemente de quais bandas foram mais reconhecidas, obtiveram mais projeção (nacional ou internacional), faturou mais (com Metal underground? Difícil, com raras exceções – risos), a Dorsal Atlântica era (e ainda é, pelo menos para quem vos escreve) a síntese – o “rosto” – do estilo no país.

Imagine-se um adolescente e/ou jovem adulto nos anos 80 que, além do sentimento de pertencimento a um coletivo, ainda contava com uma banda que escancarava de forma inteligente as amarguras e tristezas de uma nação? Vale a pena lembrar que estávamos ainda sob o domínio do regime militar.

“Todos que suportaram a tortura mentem (...). Sensacional! Tanto “Canudos” (2017), quanto “Pandemia” dialogam intrinsicamente com o público, levando-se em consideração o registro histórico de um momento, triste, revoltante e delicado. Se o planeta ainda existir e os “humanoides” (risos) procurarem por registros em 3021, encontrarão o retrato perfeito da situação de 100 anos atrás.

“Pandemia” conta com a genialidade musical de Carlos Lopes. Ele consegue fugir dos clichês do estilo, buscando riffs e melodias no imaginário coletivo musical do Brasil. “Filtrando” a agressividade e o peso das canções, encontramos referências de construções musicais típicas do vasto repertório de estilos tupiniquins. É interessante (para quem gosta, lógico) observar a miscelânea musical. Referências, as quais se encontram e se misturam de forma coesa e coerente.

Liricamente é o retrato da catástrofe atual. Encadeamento de letras inteligentíssimas, as quais abordam e escarram a misoginia, o racismo, a homofobia e outras insanidades da “atual Idade Média”, além dos abismos socioeconômicos e a desintegração dos direitos da classe trabalhadora.

O pacote é completo. Não tem como desmembrar o instrumental da mensagem, apesar de “alguns goiabas” (devem ser da goiabeira da “suposta” ministra – risos) continuarem com o discurso do “importante é o som”.

A arte gráfica do trabalho? Sem comentários. Perfeita! Se alguém ouvir o álbum e ainda não encontrar “para que lado samba”, provavelmente, “é ruim da cabeça ou doente do pé”, ou no caso do Metal, doente do “pescoço” (risos). Nota: 1000.

 

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10

 

Adalberto Belgamo

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