segunda-feira, 11 de maio de 2020

Dagor Sorhdeam: questionando as incertezas







Por Vitor Franceschini

Assim que se formou, a banda Dagor Sorhdeam já entrou em estúdio para gravar seu debut, “Fog of War”, em 2019. Tudo tão rápido, mas bem planejado, já que o conteúdo do álbum é rico e traz o Power Metal numa performance arrebatadora e criativa, além de extremamente equilibrada. Não bastasse isso, temas inteligentes e uma inspiração que vem lá de dentro complementam o trabalho. Formado por Gus Castro (vocal), Fe Nabhan (teclados/Orquestrações), Bruno Sena (baixo/guitarra) e Alex Cristopher (bateria), a banda já deu um importante pontapé inicial. Quem fala com o ARTE METAL é Nabhan, que conta tudo e um pouco mais sobre este início e o primeiro disco.

Primeiramente eu gostaria que você falasse de como surgiu o Dagor Sorhdeam, o significado do nome e a proposta inicial da banda?
Fe Nabhan: A Dagor Sorhdeam surgiu no começo de 2019 quando o nosso produtor, Thiago Bianchi, formou um time para as gravações do nosso primeiro álbum: “Fog of War”. A ideia inicial era formar uma banda de Power Metal com vocais mais graves, orquestrações, peso e refrãos marcantes. O nome da banda tem um significado, sem dúvida, mas mantemos em segredo. Convidamos todos para tentar adivinhar e ganhar produtos da banda. É uma forma que encontramos para aumentar a interação com o público.

Apesar de terem surgido em 2019, vocês são músicos com certa bagagem. Mesmo assim, o lançamento do primeiro álbum já no mesmo ano é bem rápido. Acredito que muita coisa de “Fog of War” (2019) estava pronta antes mesmo da banda se formar?
Fe: Verdade. Eu já tinha o conceito do álbum e a estrutura das músicas, mas o que fez a diferença foi a contribuição de todos os músicos da banda com suas ideias e técnicas para o desenvolvimento dessa sonoridade. Eu confiei totalmente na primeira versão apresentada por todos, que certamente viria com uma certa isenção musical. Esse desapego com formas ou estilos trouxe uma identidade própria para o nosso som, já que cada um da banda tem seu estilo musical preferido. O uso da primeira versão também foi útil para um processo mais vertical na tomada de decisões, o que certamente agilizou as gravações.

Falando nisso, parte do processo de composição do disco foi feito enquanto você estava como acompanhante de um paciente em um hospital. Eu gostaria que falasse um pouco mais sobre este processo, que está focado nas letras. Como foi se inspirar, refletir e compor desta forma?
Fe: Eu fiquei tantos meses no hospital que passei a questionar a nossa fragilidade enquanto ser humano. A percepção de que somos perecíveis e que tudo pode mudar da noite para o dia me fez vivenciar de forma mais intensa as incertezas que nos cercam sobre a família, o trabalho... o futuro. Esta vivência foi uma influência direta para a composição das letras em “Fog of War”.

Aliás, as letras trazem histórias fictícias, porém baseadas em batalhas e invasões reais. São adaptações na verdade. Fale um pouco sobre isso. De como chegou a essa ideia e como foi desenvolvê-las?
Fe: O Power Metal quase sempre esteve conectado com ficção científica, história e guerras e nada mais incerto do que uma guerra, por isso a escolha do tema. Veja, em Sur la Terre os soldados tem que decidir se saem ou não da trincheira. Em Downfall um kamikaze tem a obrigação de se atirar um navio inimigo, mas não quer. Em Voluntários da Pátria o almirante deve decidir se abarroa sua frota inteira, ou não. Em The Rise of the Phoenix, novamente a incerteza de abandonar o lar para novas conquistas. The Five Great é sobre o uso de uma bússola em uma batalha entre os reinos guerreiros da China. Battle of Ice põe em cheque a decisão do herói russo Alexander Nevsky em atacar sobre um lago congelado. Point of no Return é basicamente sobre o insuportável trauma de guerra e Algor Mortis, talvez a mais densa do álbum, fala sobre o sacrifício de um pai no fronte oriental da 2WW. Decisões e incertezas.

Aliás, apesar de o disco não ser conceitual, o nome do trabalho traz um conceito. Gostaria que falasse sobre isso também.
Fe: Já sabíamos que queríamos falar sobre incertezas em um contexto de deflagração bélica. Faltava uma base consagrada para amarrar todo esse conceito. Esta base encontramos no livro “Da Guerra” ou “Vom Kriege”, no original. Este livro é um tratado sobre guerras escrito pelo general prussiano Carl von Clausewitz. A expressão “Fog of War” popularizada por Clausewitz neste livro indica a nuvem de incertezas que envolve um conflito antes de ele eclodir. Também é possível encontrar os nomes dos capítulos do livro: “A Arte da Guerra”, de Sun Tzu, em cada música. E aqui é a primeira vez que revelamos isso!

Partindo pra parte sonora, musical... Vocês estão inseridos dentro do Power Metal. É um estilo extremamente explorado. No entanto, o Dagor Sohrdeam consegue fazer com que seu som não soe saturado, pelo contrário. Apesar de alguns clichês, é uma sonoridade que parece renovada, que traz identidade. Era isso que vocês estavam buscando?
Fe: A influência musical é muito importante para a composição de um som, mas é fundamental que a gente busque uma identidade sonora e que se mantenha fiel a ela o tempo em que for relevante ser fiel a ela. É muito legal a gente ouvir um riff de baixo tipo Iron Maiden, ou um arranjo de teclado tipo Nightwish, uma cantora tipo Tarja Turunen ou até um guitarrista que lembra o Devin Townsend. Se tentarmos copiar padrões dificilmente vamos superar os originais. Por isso, embora não tivéssemos muita noção de como poderia soar o álbum, buscamos sair do padrão. Acredito que o uso das primeiras versões para a montagem das músicas contribuiu para isso acontecer.

O peso é outro fator preponderante em “Fog Of War”. O estilo geralmente equilibra ou até perde neste quesito. Já vocês parecem fazer questão se soarem mais densos. Isso foi natural ou algo que buscaram?
Fe: Imaginamos que o fato de “Fog of War” possuir músicas com refrãos mais melódicos, mais marcantes, deveríamos compensar isso com mais peso que é o que motiva o público do Metal. Mas claro que o peso e equilíbrio são fruto do equipamento utilizado, do estúdio de gravação e fundamentalmente do produtor musical e sua equipe.
Mesmo assim, vocês conseguem inserir orquestrações mantendo o equilíbrio entre os elementos. Como é encaixar essa ‘pompa’ ao disco e continuar soando agressivo? Enfim, qual é essa fórmula?
Fe: Em um som com muitos elementos, com muitas texturas, é fundamental que os instrumentos não briguem entre si para que não ocorra interferência entre as frequências sonoras. Para isso é importante, durante o processo de composição, que cada instrumento brilhe quando deve, mesmo que isso signifique a edição e o corte de partes da música.

Acredito que a contribuição de Thiago Bianchi (Noturnall) foi fundamental pra isso. Como chegaram até ele e como foi trabalhar com Bianchi? O resultado foi o esperado?
Fe: Sem dúvida. Ele é o grande maestro por trás do projeto que somente atingiu as expectativas graças a sua bagagem, o seu profissionalismo e o seu comprometimento com a qualidade e o alto nível técnico. Eu conheci o Thiago quando entrei em contato com o estúdio Fusão para cotar a produção do “Fog of War”. Ele topou na hora encabeçar o projeto, o que foi muito legal e nos deu muita confiança para seguir em frente.

E como “Fog of War” tem sido recebido pelo público e mídia, sendo que vocês vêm trabalhando de forma independente? Algum sinal do exterior?
Fe: Por incrível que pareça nós ainda não contratamos assessoria para ajudar na divulgação do álbum e no agendamento de shows. Estamos estruturando a banda com site, mídias sociais, serviços de stream e loja virtual. As pessoas que acessam o álbum têm dado um retorno muito positivo o que nos encoraja a ir além. Também imprimimos alguns CDs, que estão com uma procura acima do esperado no exterior, principalmente na Europa. Buscamos incrementar uma base sólida de fãs para banda, com fundamentos que permitam voos mais altos no futuro.

Infelizmente, enquanto fazemos essa entrevista estamos vivendo uma pandemia, causando um isolamento que nossa geração e outras nunca viveram. Portanto acredito que houve várias mudanças de planos da banda na forma de divulgar o trabalho. Como vocês estão planejando isso?
Fe: Sim, é um fato inédito para nós que está afetando o nosso cotidiano e vai, ainda, deixar passivos mesmo depois de acabar. Claramente isso afetou a nossa programação que incluía novas versões para as músicas, videoclipe e agenda de shows. Porém, o momento agora é de se cuidar e cuidar dos seus familiares, tentando tirar o melhor proveito possível da situação.

Muito obrigado pela entrevista. Podem deixar um recado aos leitores.
Fe: Muito obrigado a todas as pessoas que nos seguem, nos apoiam, e curtem o nosso som. Obrigado especial ao ARTE METAL. O que vocês fazem pelo Metal nacional é muito bonito e especial. O apoio de vocês é fundamental para a cena metal e torna nossa comunidade mais forte. E juntos, somos fortes.

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