sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Entrevista: Save Our Souls



Por Vitor Franceschini

Foram quase 10 anos buscando experiência na cena, se aperfeiçoando e preparando-se para o lançamento do primeiro trabalho completo. Antes, um EP intitulado “Find the Way” (2011) e um single como prévia “Soul Domination” (2015). Até que no ano passado a banda Save Our Souls, de Porto Alegre/RS, soltou seu full-lenght intitulado “The Otherside” que saiu via Shinigami Records. Mostrando versatilidade e transitando por diversos estilos do Metal, o quarteto agora colhe os frutos do disco. Quem fala mais sobre o trabalho é a tecladista e vocalista Melissa Ironn, que tem ao seu lado Marlon Lago (guitarra), Andrêss Fontanella (bateria) e Jackson Harvelle (baixo).


O Save Our Souls existe desde 2006, mas o primeiro lançamento da banda só veio a calhar em 2011 com o EP “Find The Way” e somente agora em 2015 o álbum “The Otherside” foi lançado. Por que essa demora? A banda compõe desde seu surgimento?
Melissa Ironn: Apesar de iniciar em 2006, naquela época não tínhamos nenhuma perspectiva do que queríamos ser no futuro. Estávamos tocando apenas covers para nos divertir e aprender a tocar em conjunto com outras pessoas e em estúdio. Lá pelo segundo ano de existência, em 2007, começamos a compor e então começamos a nos descobrir. Mas somente em 2009 que nos sentimos seguros para sair pras ruas e fazer shows, por isso, consideramos que a Save Our Souls iniciou suas atividades de fato em 2009. Mas o EP foi gravada já em 2009 e em seguida do término das gravações, que se deu em torno de dezembro ou janeiro de 2010 (confesso que já não lembro bem - risos), já disponibilizamos o EP para audição no nosso MySpace e para download, mas foi em 2011 na abertura do show do Kamelot que lançamos o material físico, então o EP existe desde 2009, quando inclusive já era possível obtê-lo em formato digital. Quanto ao “The Otherside”, das dez composições, nove delas já existiam, muitas há alguns anos, pois nós não paramos de compor depois do EP. Gostamos muito disso! Apenas a faixa Dark Enigma que foi composta após a entrada do Jackson (baixista) na banda e logo antes do início das gravações. Mas acontece que o processo de produção de um álbum é muito mais complexo do que imaginávamos, demanda tempo, dedicação e, além disso, é um grande investimento. Escolhemos um estúdio distante de onde vivemos, por isso, tínhamos algumas dificuldades de conciliar nossas agendas para poder viajar. Todos nós mantemos outros empregos... Tudo isso contribuiu para a demora no lançamento, foram dois anos entre gravação e mixagem/masterização. E também, não posso deixar de destacar que demoramos algum tempo entre o EP e o início da produção do álbum porque foi realmente uma decisão bem difícil, chegar àquele momento em que decidimos “vamos gravar um CD”, não é algo tão simples...

E como foi o processo de composição do debut? Vocês sentiram algum tipo de pressão ou ansiedade por se tratar do primeiro álbum?
Melissa: Na verdade, nós primeiros fizemos todas as composições e somente mais tarde veio a decisão de gravar o álbum. A única composição que estava em andamento na época, como apontei antes, foi Dark Enigma. Mas a maior pressão mesmo foi no momento de dar vida a essas músicas, durante o processo de gravação, principalmente porque, infelizmente, faltaram recursos para que pudéssemos lançar antes e nós queríamos lançar logo o álbum. Isso realmente causou bastante ansiedade, havia bastante expectativa nossa e do público também, e parecia que não chegava nunca ao final! (risos)

A faixa que abre o disco, Another Life, é uma música perfeita para tal, afinal traz tudo que a banda oferece em uma música. Vocês concordam com isso? Foi esse o motivo estratégico da escolha para ela abrir o trabalho?
Melissa: De faro, Another Life já foi feita com uma introdução orquestral, pensada para abrir os trabalhos, tanto nos shows como num futuro álbum, como depois veio a acontecer. Aliás, a ordem toda das faixas foi escolhida por algum motivo...

Aliás, o foco principal da banda é o Gothic Metal. O estilo não anda tão em alta e foi explorado de diversas formas. Como buscar uma sonoridade que convença apostando nesta faceta do Metal?
Melissa: Não diria que é nosso foco porque os vocais femininos não foram pensados para isso, nem mesmo os arranjos que fiz com os teclados e orquestrações. Gosto bastante de trilha sonora de filmes e essas coisas, jamais pensei em explorar um estilo em específico como o Gothic Metal ou Symphonic Metal. Mas há uma necessidade das pessoas de rotular as bandas, por isso, acabaram por nos denominar desta forma... E também preciso destacar que as pessoas começaram a associar bandas com vocais femininos e teclados a esse estilo, mas há uma distorção nos conceitos. Acaba que tudo recebe a mesma classificação pela simples existências destes dois elementos, se descartando todo o restante do que a banda tem, o que é uma pena. Nós nunca pensamos em seguir qualquer estilo pré-determinado, nós somos quatro pessoas bem diferentes entre si e com diversas influências. Por isso, além do que está na superfície que são os vocais femininos e os teclados, existe um belíssimo trabalho dos meus companheiros de banda nas cordas e bateria que agregam outros elementos que inclusive não poderiam ser associados a alguma intenção de se enquadrar no Gothic ou Symphonic Metal. Felizmente, boa parte do nosso público já tem se dado conta disso, já tivemos relatos de pessoas que nos julgavam por esse estereótipo e que ao ouvir o trabalho tiveram uma experiência bem diferente do que se imaginava porque somos diferentes disso. Por fim, eu diria que os pré-conceitos nos levaram a esse rótulo...

Vocês também mesclam com elementos do Prog Metal, estilo que casa bem com a proposta principal. Fale-nos um pouco a respeito disso.
Melissa: Existem vários elementos nas nossas músicas, inclusive o Prog Metal. Isso é resultado da convergência das nossas influências mais diversas.  O nosso baterista, Andrêss Fontanella, bebe muito dessa fonte nas suas influências, mas no geral nós gostamos de dinâmica e contraponto, não gostamos muito de músicas muito retas, que começam e terminam da mesma forma ou em que todos seguem a mesma linha. A música é feita de momentos de acordo com a mensagem que se quer passar, acho que por essa concepção que temos como compositores, o Prog se faz bastante presente nesse sentido, mas não nos arranjos rebuscados cheios de técnica e “fritação” de solos intermináveis. Mesmo porque, essa concepção que, acredito que venha do Prog, se mistura também a outras influências mais diretas como o Heavy e Thrash Metal, bastante presentes nos nossos riffs de guitarra quebrados e pesados, além das vozes e teclados que já vão por um outro caminho. Basicamente, existem várias coisas acontecendo ao mesmo tempo, mas de forma sinérgica e convergente que formam a personalidade da banda. E isso tende a ficar mais “visível” daqui pra frente...

Foto: Jail T Junior

Falando agora dos seus vocais. Você possui uma versatilidade interessante que só ganha pontos à sonoridade. Como trabalha essas linhas?
Melissa: Puxa, obrigada! Eu venho me desenvolvendo como vocalista no sentido de redescobrir a minha voz, minhas capacidades, não só técnicas, mas de interpretação mesmo, de como minha voz pode soar de acordo com necessidade estética. Quando eu entrei em estúdio para gravar o “The Otherside” foi uma experiência totalmente diferente e eu mesma como pessoa também estava em processo de mudança. Por isso, foi um momento em que comecei a me redescobrir, e tomar consciência de quem eu sou de verdade como vocalista/pessoa, mas considero que ainda foi o início do processo, há sempre muito a aprender e evoluir, ainda vejo um longíssimo caminho de aprendizado pela frente e eu ainda quero desenvolver mais essa versatilidade. Mas o que rege tudo isso mesmo é a minha convicção de que cada música é uma mensagem, por isso, existem momentos mais suaves e outros mais agressivos durante o álbum.

Outro fator que chama atenção na sonoridade do debut é que ela caminha entre a intensidade e a suavidade, concorda? Isso é algo que vocês se preocuparam ou fluiu naturalmente?
Melissa: Fluiu naturalmente. Cada música tem um significado, por isso, não poderia falar sobre o dia do julgamento, culpa e tudo mais de forma delicada na faixa The Judgemente Day, tão pouco poderia falar de esperança aos berros em The Sound of Heart, concorda? A música pede coisas pra gente, não somos nós que temos que determinar o que não pode ser determinado por nós! Se decidimos falar sobre determinado assunto, no mínimo, a sonoridade tem que caminhar junto, tem que transmitir isso, não dá pra contrariar ou ficaria sem sentido!

“The Otherside” foi gravado e mixado por Diego Voges no UFO Audio Studio. Como foi trabalhar com Diego? O resultado final atingiu as expectativas da banda?
Melissa: Trabalhar com o Diego com certeza foi ótimo! Encontramos uma pessoa maravilhosa, além do produtor competente. Ele curtiu junto com a gente cada momento, dá pra se dizer que viveu o sonho conosco. Embora o Diego tenha sim contribuído muito para o resultado, afinal ele que botou a mão na massa e fez tomar vida as nossas músicas, ele nos deu liberdade total de fazer soar o álbum como nós queríamos. Por isso, tudo o que se pode ouvir no álbum é fruto das decisões da banda, nós opinamos nas timbragens, nos volumes na mixagem, nos efeitos, etc, etc. O resultado foi que nós escolhemos e isso é ótimo!

E como está a repercussão do disco? Como a crítica e o público o tem recebido?
Melissa: Olha, confesso que tem sido bem variada! (risos) Tem tido críticas muito positivas do público e da mídia também, mas ao mesmo tempo eu sinto que ainda existe um certo receio das pessoas em relação a banda com vocais femininos no Metal. E disso às vezes resultam análises bem superficiais mesmo... Mas faz parte! Acho que tanto o que é bom, como o que é em termos “ruim” serve de aprendizado! No geral tem sido muito boa a repercussão, de alguma forma o “The Otherside” tem atraído a atenção e curiosidade das pessoas e é pra isso que fazemos música, para as pessoas.

O trabalho foi lançado pela Shinigami Records, um dos maiores selos do país. Como surgiu essa oportunidade e como está o trabalho com eles?
Melissa: Correndo atrás mesmo! Acho que tem que desmistificar na cena é que as coisas não acontecem porque a banda tem um trabalho legal por aí e de repente acontece um milagre e alguém ouve e decide nos ajudar! (risos) Essa oportunidade veio da nossa busca mesmo por um selo. Conhecíamos a Shinigami, trabalhos que foram lançados por eles e então resolvemos tentar. Entramos em contato e fomos bem recebidos! Recebemos um sim e ficamos muito felizes de ter o nosso trabalho associado a um dos maiores selos do país! 

Como anda a agenda de shows da banda? Tem havido espaço para tocar?
Melissa: Infelizmente não há tanto espaço para bandas autorais, como gostaríamos que tivesse. Mas felizmente, ainda é possível movimentar a agenda com um ou dois shows mensais. Acho também que o público tem se guardado para seus grandes ídolos, por isso, muitas pequenas casas de shows e bares não estão investindo muito em bandas independentes ou mesmo as mais “iniciantes” como nós que estamos exibindo um primeiro trabalho autoral. Eles procuram um público mais consolidado através de bandas covers e ainda há um certo descaso com o trabalho das bandas em geral, tanto autorais como cover. Ainda existe o tipo de gente que acha que oferecer o palco pra banda tocar e “divulgar o seu trabalho” é o suficiente, e até para simplesmente cobrir os custos de transporte é uma choradeira. É preciso jogo de cintura para que todos saiam satisfeitos.

Recentemente vocês soltaram um documentário mostrando as gravações do disco no Youtube. Como surgiu essa ideia e qual o objetivo de lançar algo do tipo?
Melissa: A ideia era mostrar um pouco do que passamos e sentimos durante esse processo. Foi algo realmente muito intenso e queríamos dividir isso com as pessoas! Era também uma forma de mostrar quem nós somos e porque fazemos isso.

Muito obrigado. Podem deixar uma mensagem aos leitores.
Melissa: Gostaria, primeiramente, de agradecer pela entrevista, pelo espaço que o blog tem dado, não só para nós, mas também para outras bandas, porque é muito importante que ainda haja pessoas dispostas a movimentar a cena e ajudar a divulgar os trabalhos do pessoal. Aos leitores eu digo: Ouçam o “The Otherside”, abram suas mentes e curtam o trabalho que foi feito com muito empenho e muito carinho, e que pode ser surpreendente se você se permitir. Ah também, acreditem no que é nosso, tem muito trabalho de qualidade no Brasil.


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