terça-feira, 20 de outubro de 2020

In Lo(u)co: U2 - POPMART TOUR (1998-01-31: Morumbi - Sao Paulo, Brasil)

 


Por Adalberto Belgamo

 

Na primeira vez da banda irlandesa no Brasil, a discussão era que o Rock tinha morrido. Mais de duas décadas depois e a discussão continua a mesma. Morreu? Não. Está onde sempre esteve.

O estilo como movimento cultural de massa, como costumava ser desde o seu nascimento, morreu? Sim. Isso não quer dizer que está no fim, moribundo. A forma mais pura do estilo (e derivados) sempre esteve (está) nas garagens e nos clubes menores. As últimas representações significativas do estilo aconteceram na década de 90 com o Grunge e o Britpop. Segue o jogo.

O momento atual lembra bastante os anos 80. O mainstream dominando o cenário da música ocidental e os demais estilos nos seus respectivos nichos. Falando sobre essa década, com certeza, foi uma das mais ricas em termos de criação e produtividade musical. “N” estilos (maravilhosos!) para todos os gostos. Da “sujeira” das bandas de garagem ao sinthpop, passando pelo Metal (Thrash and Death, principalmente), sem falar no Pop agradável, bem feito e “variado”. Não era como hoje, em que os “mesmos” doze produtores fazem o “mesmo” tipo de música para os “mesmos” tipos de estilos e vozes.

 

No meio de todo esse contexto, havia o U2!

O The Edge é um dos principais guitarristas que surgiu na história da música. As texturas e arranjos de guitarras são de uma preciosidade e criatividade enormes! É um dos poucos, que sabe usar equipamentos e tecnologia com maestria. O estilo próprio abriu e pavimentou vários caminhos. Conquistou e influenciou gerações de músicos.

Uma das características da banda é a solidez na formação. Cada integrante trabalha para o coletivo, fazendo com que o resultado final se concretize coesa e coerentemente, oferecendo infinitas possibilidades de composição e estilos diferentes. Vão do Pós-Punk (muitas vezes mais punks que os próprios punks - risos), passam pelo Rock clássico, aportam no Gospel e se misturam ao Pop e a Eletrônica.

É uma banda politizada. Não poderia ser de outro jeito. Nasceram dos conflitos políticos/religiosos da Irlanda do Norte.

Não. Não dá para ser fã (ou no mínimo apreciar o trabalho) se politicamente é alinhado à (extrema) direita. Não dá para separar música da política em bandas como o U2. Alguma coisa errada não está certa.

Em outros casos, desde que não haja muita “besteira e declarações bizarras” envolvidas, continue a ouvir as bandas e seja feliz. E ainda a respeito do patrulhamento, essa cultura do cancelamento cultural já extrapolou os limites da razão. Tem de haver um revisionismo histórico e linguístico, mas não no momento em que há milhões de desempregados e pessoas passando fome.

A primeira vez da banda no Brasil aconteceu durante a turnê do disco Pop. O próprio nome do trabalho e a incorporação de estilos, que a eles sempre buscaram, fez alguns fãs xiitas torcerem a napa (risos). Se você, caro leitor, acredita no radicalismo apenas no Metal, está redondamente enganado. Essa “praga” de bolhas culturais está em todos os lugares.

A banda entrou de cabeça na cena eletrônica, que varria outros estilos musicais, principalmente na Europa. O Bono chegou a declarar que o Rock estava morto (risos), o que fez mais “lunáticos” rejeitarem (odiar) a banda, mesmo sem conhecer música eletrônica ou mesmo ter ouvido o álbum. A história é cíclica e, portanto, certas aberrações vão e voltam. Pesquise e comece a entender a música eletrônica. Surpresas agradabilíssimas acontecerão.

E partimos para o show. No caminho para a praça, de onde sairia a excursão, resolvi pegar carona na moto de um, amigo. Não era o Carlão. Piada interna (risos). Sem capacete, a polícia mandou parar. Tinha duas opções: estressar-se com os “homi” ou ficar quieto. Preferi  a segunda, já que queria ver o show (risos).

Viagem agradável com os amigos em um dos ônibus da excursão. Mas como sempre acontece algo pitoresco, o motorista (de uns 132 anos - risos) era um senhor que não dirigia “profissionalmente” há décadas. Tenso. Ainda bem que ainda podia fumar (cigarros e outras coisas... risos) dentro de veículos fretados. Eu olhava para a cara do motorista e já o imaginava dormindo ou com uma parada cardíaca (risos). A volta foi mais tranquila por causa do cansaço. No entanto, em cada sacolejo do ônibus, eu acendia um cigarro e agarrava o banco da frente (risos).

 


A primeira vez a gente nunca esquece, mesmo que ela dure menos de um minuto (risos).

O Morumbi estava lotado. Consegui apenas o ingresso de arquibancada. Se por um lado é longe do palco, por outro é legal para assistir às grandes produções. Bandas como o U2 não brincam com a concepção de palco e narrativa do show. Impressionante!

A abertura foi feita pela banda Bootnafat (ou algo assim) e pelo Gabriel Pensador. A primeira, eu não vi. O Gabriel se esforçou bastante e conseguiu diminuir a impaciência do público em um calor infernal.

Nada é perfeito, mas o U2 ao vivo chega muito perto da perfeição! A simbiose entre  Bono, The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen Jr é espantosa. É o exemplo perfeito do coletivo acima do individual. Logicamente, as grandes “estrelas” da banda são o Bono e o The Edge. Mas a cozinha (baixo e bateria), senhoras e senhores...

São tantos elementos acústicos, eletrificados e computadorizados juntos, que, em um primeiro momento, tem-se a impressão que algo irá falhar feio. Ledo engano. O set list se encaixava milimetricamente à concepção visual do show. A interpretação e a precisão da execução das canções deixavam o público perplexo com a qualidade, sensibilidade e, acima de tudo, o sentimento incorporado à performance! Inesquecível!

Set list: Mofo. I Will Follow. Gone, Even Better Than The Real Thing, Last Night On Earth, Until the End of the World, New Year's Day, Pride (In the Name of Love), Neon Lights (snippet) / I Still Haven't Found What I'm Looking For, All I Want Is You, Staring at the Sun, Sunday Bloody Sunday, Bullet the Blue Sky, Please / Sunday Bloody Sunday (snippet), Where the Streets Have No Name. Lemon (Perfecto Mix). Discothèque / Take Your Partner By The Hand / Black Betty ( Stayin' Alive), If You Wear That Velvet Dress, With or Without You, Hold Me, Thrill Me, Kiss Me, Kill Me, Mysterious Ways, One / Hear Us Coming, 40.

Não foi um espetáculo apenas musical, mas “outra coisa” de difícil classificação! Dizem que o Rogério Águas (Roger Waters - risos) traz concepções no mesmo nível, mas infelizmente não consegui ainda vê-lo ao vivo.

 


Agora vem a parte trágica do show.

Normalmente, várias alternativas (saídas) estão dispostas para a dispersão do público após o final do espetáculo. Não sei quem teve a linda ideia de afunilar todos os setores em um único local. Resultado: houve uma aglomeração indesejável de milhares de pessoas tentando sair a qualquer custo, empurrando umas as outras. Pessoas passando mal e desesperadas. A sorte é que havia um muro, que dava acesso a um terreno vazio. Tive de ajudar várias pessoas a pular o muro ou segurá-las na descida. Lição aprendida: ser o último a sair do local do show (risos) e evitar o afunilamento.

Inté! 

 

*Adalberto Belgamo é professor, atuando no museu (sem ser peça... ainda - risos), colaborador do Arte Metal, além de ser Parmerista, devorador de música boa, livros, filmes e seriados. Um verdadeiro anarquista fanfarrão.

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