Voltando com a seção
Killing Yourself, o ARTE METAL apresenta apenas uma mudança. Ao invés de focar
em uma banda, focaremos em um músico com grande prestígio na cena (ou não –
risos). No caso, nossa reestreia traz o mestre André Delacroix, baterista
pioneiro no cenário metálico nacional. O músico acumula mais de 30 anos de
carreira dedicados à música pesada e com passagens por nomes como Imago Mortis
e Dust From Misery, tem como marco histórico e sua principal banda o legendário
grupo carioca Metalmorphose. É muita história pra contar, então confira como
ele discorre sobre suas principais contribuições fonográficas durante essas
mais de três décadas.
“Ultimatum” – Metalmorphose (Split com a
Dorsal Atlântica – 1984)
“Nossa, faz tanto tempo! (risos) Na verdade,
foi uma experiência que eu só não chamo de “totalmente nova” porque a banda já
tinha feito uma gravação “caseira” pouco tempo antes. Mas, sem dúvida, foi um
momento de alegria para todos nós, sabermos que estávamos registrando os nossos
sons autorais e ‘entrando’ no mundo das bandas com material gravado. Mal
sabíamos que se tornaria um clássico e um dos primeiros registros de Heavy
Metal no Brasil todo. Em termos de produção, nós estávamos totalmente nas mãos
do engenheiro de som, que, no máximo já devia ter gravado algum Rock N´Roll,
mas, Metal, nunca! Ou seja, foi tudo feito meio que ‘no susto’ e sem prévia
experiência. Daí a falta de peso e a sonoridade bem cru e aquém do esperado, em
termos de Heavy Metal. A temática era bem voltada para a ‘luta pelo Metal’ e
para os fãs do Metal. Algo bem clichê, mas
verdadeiro até o osso. Em 83/84 (o disco foi gravado em 84, mas só foi
lançado em 85, porque naquela época tudo demorava mais!) havia poucas bandas de
Metal em atividade no Rio. A cena estava se formando, então, nós , com orgulho,
fizemos parte dessa primeira geração (na verdade, Azul Limão e Dorsal Atlântica
vieram um pouco antes), nos apresentando em qualquer lugar que nos oferecesse
espaço (escolas, clubes, planetário, churrascaria, etc), sempre com grande
presença por parte dos fãs pioneiros na cidade. Tempos românticos! Hoje em dia,
esse split se tornou um marco no Metal brasileiro, figurando entre os primeiros
registros fonográficos do estilo no Brasil (junto ao Stress, Karisma, SP Metal e
Robertinho de Recife) e um álbum que sempre é mencionado quando o assunto é ‘Primórdios
do Heavy Metal Nacional’.
Metalmorphose na década de 80 |
“Dust From Misery” – Dust
From Misery (1997):
Gravar esse álbum do
Dust, foi a maior curtição. Entramos no estúdio, muito bem ensaiados, as
músicas eram empolgantes e a galera estava animada em registrá-las. Aí, eu já
tinha bastante experiência em gravar registros (na maioria demos, até então),
então fiquei super confortável e considero uma das minhas melhores performances
gravadas, até porque as músicas davam muito espaço pra eu me soltar e “mostrar
serviço”.
O Dust falava sobre assuntos diversos como relacionamentos,
espiritualidade, atualidades, etc. Não havia uma temática específica, então as
letras acompanhavam a diversidade musical. O disco foi produzido pela própria
banda e a galera já tinha uma ideia formada sobre o tipo de sonoridade que
queria alcançar. Eu acho que o resultado final ficou bem legal, pra época. Na
época em que o álbum foi lançado, havia uma cena bem legal no Rio de Janeiro,
com várias bandas com ‘som próprio’ (Scars Souls, Imago Mortis, Endless,
Unmasked Brains, Dementia, Allegro, etc)
todas lançando bons registros (CD’s ou demos) e se apresentando juntas
pela cidade, mais notadamente na tradicional casa de shows Garage (extinta,
hoje em dia). Esse álbum foi lançado pela extinta gravadora Megahard e acredito
que, infelizmente, não tenha sido mais bem sucedido, devido a uma divulgação
fraca por parte da mesma. Provavelmente ele é um álbum considerado ‘cult’,
difícil de ser adquirido, atualmente. Mas, acredito que ele seja um álbum que
mostra como um álbum pode ser ‘bem costurado’, mesmo incluindo uma grande
diversidade de influências musicais (Heavy, Thrash, Prog, Rock, Mantras,
Industrial, etc).
Dust From Misery |
“Vida: The Play of Changes”
– Imago Mortis (2002):
Eu já tinha um grande
respeito e admiração pelo Imago, quando fui chamado pra tocar na banda (na
verdade, os irmãos Fábio e Fabrício me viram tocando com o Dust From Misery e
curtiram e me chamaram – mesma coisa que aconteceu com o vocalista Alex
Voorhees que foi meu colega no Dust), logo, aceitei o convite, com alegria. E
maior sorte ainda, foi que eu entrei poucos meses antes de gravar esse registro
que se tornou um clássico do Doom Nacional e um álbum bastante respeitado e bem
considerado no país. Na verdade, eu entrei na banda com todos os (excelentes)
arranjos de batera, já feitos pelo baterista original da banda, Flávio Duarte,
e fui muito fiel ao trabalho dele, só adicionado ou tirando uma coisinha aqui e
outra ali. Bom, resumindo rapidamente, o CD fala sobre um paciente em estágio terminal
de uma doença chamada ‘Vida’ e das fases pelas quais ele passa durante esse
processo, até chegar à sua morte. O CD foi gravado em um estúdio de ponta da
época, o Creative, e a produção ficou por conta dos visionários irmãos Fabio e
Fabrício, que já tinham uma ideia muito detalhada do que queriam para o CD.
Esse foi o primeiro trabalho que eu registrei com click e em Pro Tools. Eu
sempre fui um cara muito do ‘feeling’ ao tocar, então tive que treinar bastante
com o click, pra estar à vontade na hora de gravar. Como o Alex disse, “esse
foi o CD mais melancólico, gravado da forma mais divertida possível”. E é
verdade. Apesar da banda tocar um som denso e melancólico, nos ensaios, nós
éramos uma ‘família’ bastante unida e bem humorada. Bons tempos. Eu acredito
que o “Vida” seja um clássico do estilo, no Brasil. Ele realmente foi um álbum
muito bem composto e executado e que mostrou que um trabalho conceitual, com
uma produção de ótima qualidade, podia ser feito no Brasil.
“Transcendental”
– Imago Mortis (2006)
Após a saída dos
talentosíssimos membros fundadores (e principais compositores) Fábio e
Fabrício, muitos acreditaram que a banda tinha perdido o seu caminho. Mas, foi
um grande prazer, ver que o novo time de composição (liderado pelo vocalista
Alex Voorhees) ainda conseguiu respeitar a herança da banda e lançar um ótimo
trabalho. A banda novamente registrou o álbum no estúdio Creative e rolou
aquele clima de ‘tô em casa’ e ‘brodagem’ com a equipe de lá. O click não era
mais novidade, estávamos bem ensaiados, então tudo correu ‘macio’ e mais um
petardo foi registrado. Em termos de conceito, o “Transcendental” segue de onde
o “Vida” acabou, falando, então, sobre o pós morte, o espiritual. A produção
foi feita, mais uma vez, pela banda. Nessa época, o Imago caiu na estrada pra
divulgar o CD e realmente passou por várias experiências marcantes, pelo
Brasil. Deu pra sentir o carinho e a admiração que os fãs têm pela banda, mesmo
com as mudanças de formação e tal. Época muito divertida e, também, de muito
suor deixado pelos palcos do país. O Transcendental foi um ótimo trabalho
lançado pela banda, mas, talvez não tenha tido tanta atenção quanto o “Vida”,
que realmente era um peso pesadíssimo a ser ‘superado’. Apesar de tudo,
acredito que ele tenha representado muito bem o talento e dedicação da formação
da banda na época.
Imago Mortis |
“Maldição”
– Metalmorphose (2009) (Compilação)
Pra esse álbum, a
galera estava, novamente, muito bem ensaiada e a química entre os integrantes
maior ainda, após vários shows juntos. O estúdio (extinto) Master era muito bom
e a equipe super gente boa. Tudo correu tranquilo e ficamos satisfeitos com um
produto de qualidade muito superior ao da estreia, no split. A produção foi da
própria banda e a temática, mais uma vez, falava de experiências pessoais, do
cotidiano e da ‘luta’ pelo Metal. Eu me lembro que nós já tínhamos feito um bom
nome no Rio, com shows sempre cheios e a galera realmente animada com a banda.
Mas, a grande cagada, na época, foi que essa demo com seis músicas nunca foi
lançada oficialmente e só circulou em forma ‘extra oficial em K7’, pelo
underground carioca. Uma grande pena, pois a qualidade sonora / produção e
performance dos músicos é infinitamente superior ao “Utimatum”, apesar de ter
sido gravado somente um ano depois. Finalmente, em 2009 (24 anos após ter sido
gravada), essa demo foi lançada em formato CD com extras e finalmente teve uma
exposição maior. O lançamento do “Maldição” representa o resgate histórico de
um ótimo trabalho que havia tido pouca exposição na época de sua gravação e um
dos sinais de que a banda estava voltando a ativa.
“Máquina
dos Sentidos” – Metalmorphose (2012)
Foi muito legal.
Começamos nosso ‘ciclo’ com o produtor Gustavo Andriewski (da banda Silent) e
com a gravação das bateras no estúdio HR, coisa que se repetiria nos dois próximos
discos da banda. A satisfação de gravar,
finalmente, o primeiro full length da banda, após tantos anos, adicionou um
clima especial ao registro. A temática da banda se baseava mais nas coisas do
cotidiano, mas com uma ênfase maior em mensagens positivas. A produção do Gustavo capturou bem o momento
da banda e suas contribuições em arranjos também foram importantes pra o
resultado final do petardo. Lembro que estávamos todos empolgados com o
registro e com essa ‘oficializada’ da volta da banda. Vínhamos de alguns shows
bem sucedidos (inicialmente apenas com o intuito de celebrar o passado), que
nos ajudaram a retomar o espaço da banda no meio e sentimos que com esse novo
trabalho, estávamos no bom caminho para evidenciar o nosso retorno com força total
ao mundo do Metal. Representa um bem sucedido retorno da banda às atividades,
mostrando que a nova formação tinha muito o que mostrar e que a banda não
precisava viver de passado pra reconquistar seu espaço. O ‘Mark II’ da banda
foi muito bem aceito. Novos clássicos ( Jamais
Desista / Máscara) agradaram os
antigos e novos fãs e uma nova porta se abriu pra banda.
“Fúria
dos Elementos” – Metalmorphose (2015)
Em termos gerais, foi
bem parecido com o “Máquina...”. Mesmo estúdio, mesmo produtor, mas, dessa vez,
já tínhamos um parâmetro pelo qual sofrer comparações, já que o “Máquina...”
foi muito bem recebido pela imprensa e fãs. No “Fúria...”, nós resolvemos nos
soltar bastante em termos de composição e o resultado ficou bem legal, com
algumas músicas maiores e mais complexas
em termos de arranjo, mescladas ao Heavy Tradicional já conhecido. Mais uma
vez, as similaridades com o Máquina, em termos de temas e produção se fazem
presentes. Tivemos uma troca na formação com a saída do Leon Mansur e entrada
do Marcos Dantas (ex-Azul Limão/ X- Rated) o que trouxe renovação pro time de
composição. Me lembro de que havia uma certa expectativa em relação ao álbum,
por parte dos fãs. “Vai ser igual ao Máquina”? “Como será que está o som, agora
que o Marcos Dantas entrou?” E, na verdade, também ficamos ansiosos para ver a
reação dos fãs. Tudo acabou bem (risos). O “Fúria...” representa a confirmação
de um nível de qualidade muito bom (humildemente afirmo) por parte da banda e a
certeza de que a banda estava embalada para seguir em frente nesse “Mark II”
com garra e fome de Rock Pesado.
Metalmorphose atual |
“Ação
& Reação” – Metalmorphose (2017)
Eu me preparei bastante
pra gravar esse álbum e ele teve inclusive algumas músicas que tiveram seus
arranjos criados para acompanhar letras minhas e levadas de bateria, também.
Com o Big prestes a deixar o país e sem tempo pra se dedicar totalmente à prática,
algumas músicas foram ‘sopradas’ por mim, enquanto gravávamos e funcionou muito
bem! No mais, ficamos todos super à vontade. Eu, gravando novamente no Estúdio
HR, onde sempre sou muito bem tratado e assessorado, e os demais integrantes
gravando no Estúdio Naked Butt de propriedade do nosso produtor. Dessa vez, tivemos uma participação maior dos
integrantes, em termos de composição de letras e o produtor Gustavo Andriewski
conseguiu uma produção mais crua e “na cara”, que combinou bastante com as
músicas mais diretas, compostas pro disco. Bom, as gravações de batera e baixo
foram feitas meio ‘a toque de caixa’, porque eu sugeri nós gravamos o paly
antes do Big (André Bighinzoli – baixista original) se mudar para a Itália.
Reunimos o material que tínhamos, em tempo recorde, vimos que tínhamos material
interessante e bastante diversificado e de qualidade e ensaiamos a “cozinha” em
ritmo alucinante, para podermos registrar o “alicerce” rapidamente. Curioso foi
que essa primeira parte foi registrada rapidamente, no final de 2015, mas o
álbum (que havíamos planejado para 2016) só foi sair em 2017, devido a conflitos
de agenda com o Gustavo. De qualquer maneira, esse tempo acabou sendo útil. O
“Ação e Reação” acabou saindo bem diversificado, variando entre momentos mais
diretos e outros mais épicos, mas com um ‘ar’ bem mais espontâneo e de fácil
assimilação. É aquele tipo de álbum que já agrada na primeira audição. Algumas
pessoas disseram que o consideram o melhor da banda, o que obviamente é muito
satisfatório de se ouvir. Com algumas músicas mais para o Hard Rock e até um
Blues, deu pra banda mostrar que ainda temos lenha pra queimar e não precisamos
ficar presos o tempo todo a uma mesma fórmula, para mantermos os fãs
satisfeitos.
Boa matéria! Grande batera! Cheguei aqui após procurar informações (raríssimas) sobre o Dust from Misery, banda que tem um álbum bem diversificado.
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