Por
Vitor
Franceschini
O Ministério da
Discórdia é formado por Mauricio Sabbag (vocal/guitarra), Carlos Botelho
(baixo) e Inacio Nehme (bateria). Sua história soa comum na cena, isto é,
surgiram fazendo covers e depois resolveram apostar na música autoral. O
diferencial é que o power-trio, apesar da escola das versões, mostrou uma
identidade muito forte em seus dois lançamentos que culminam num full
auto-intitulado de 2013 e um EP, “Abismo”, lançado em 2016. Para falar sobre
estes e outros assuntos, Maurício e Inacio responderam às perguntas do ARTE
METAL, inclusive a que fala sobre a banda ser o Black Sabbath brasileiro.
São
dez anos de carreira com um álbum e um EP lançados. Não acham muito pouco para
os dias de hoje apenas dois trabalhos no mercado? (risos)
Inacio:
Acho que sim! Passamos muito tempo fazendo cover na noite, depois começamos a
mesclar as autorais... Quando resolvemos dizer “chega” para cover já tinham se
passado uns 5 anos!
Aliás,
como vocês vêem o primeiro disco, “Ministério da Discórdia” (2013) atualmente e
por que este trabalho saiu somente depois de seis anos da banda formada?
Maurício:
É um álbum rústico, direto, seco, honesto. Nesses seis anos, nós testamos as
músicas próprias em bares, misturando no meio de um repertório com músicas das
grandes bandas inglesas setentistas. Quando percebemos que algumas pessoas
prestaram atenção em nossos sons sem passar mal ou nos xingar, ousamos aumentar
a quantidade de músicas autorais ao vivo. Mas ainda faltava que decorassem as
letras e isso só aconteceu, de fato, após gravarmos e divulgarmos.
Inacio:
Passamos muito tempo fazendo cover, tentando achar a nossa própria identidade,
mas em um processo relativamente lento.
Falando
da transição deste trabalho para o atual EP “Abismo” (2016), quais as
principais diferenças entre os dois discos?
Inacio:
Eu
acredito que o “Abismo” seja mais maduro. Nele conseguimos colocar as
composições do jeito que queríamos e o processo de gravação ocorreu de forma
mais tranquila.
Maurício:
No “Abismo” nossa técnica evoluiu um pouco. Perdemos o medo de nos aventurar
por caminhos que fogem um pouco do "metalzão". Nos ensaios rolava Tim
Maia, Mutantes, Ramones, uns blues e até umas tentativas frustradas de jazz.
Falando
do “Abismo” em si e até da sonoridade da banda de uma forma geral, vocês trazem
influências naturais de Black Sabbath e seus discípulos. Porém o Ministério da
Discórdia mostra um lado mais enérgico e divertido de certa forma. Vocês
concordam com essa definição? O que podem falar a respeito?
Maurício:
Interessante você dizer "divertido", pois tinha gente que nos associava
ao Punk Rock. Quando começamos eu não gostava quando diziam isso, mas com o
passar do tempo mudei de opinião e descobri o caminho da luz. Hoje reconheço a
genialidade de quem cria músicas fantásticas com poucos acordes, como faziam o
Johnny Ramone e o Lemmy, e acho que o Ministério da Discórdia logo terá
repertório que poderá encaixar em eventos desse estilo.
Inacio:
A gente não se prende ao sindicato sabático na hora de escrever ou criar um
som. Temos uma série de influências diferentes na banda que acabam mexendo com
o trabalho. Adoramos Doom, Stoner e outros estilos de Metal, lógico, mas as
coisas vão evoluindo naturalmente e sem esse tipo de amarra.
No
disco, as mudanças de direção, variação rítmica e viradas insanas são outros
pontos fortes da banda, que além de tudo consegue investir em uma melodia
diferenciada e densa. Isso é complexo, mas é feito de forma natural no
trabalho. Qual a preocupação de vocês com a sonoridade do disco para que ela
seja mais digerível para o ouvinte?
Inácio:
Talvez seja por isso que lançamos poucos álbuns! (gargalhadas). Tentamos sim,
fazer um som que seja digerível, de certa forma. Foi uma opção, desde o começo,
manter o vocal limpo para que as pessoas entendessem a letra de verdade. O
resto, em termos de levadas/estruturas são parte do processo criativo... Só
termina quando sabemos que o que queremos realmente está ali.
Maurício:
Tem muita banda de Metal que camufla as letras das músicas embolando tudo com
uma super distorção de guitarras porque realmente não tem o que dizer ou mesmo
por que não está segura da mensagem que quer transmitir. Nós fazemos o possível
para que o ouvinte reconheça em seu subconsciente que estamos tratando de
assuntos relevantes que são de seu interesse.
Foto: Leandro Medina |
Vocês
optam por cantar em português. Mesmo que hoje em dia a língua pátria apareça
mais dentro do Rock / Metal, ainda há certa resistência por parte disso. Por
que acham que isso acontece?
Maurício:
Grande parte da resistência ocorre não por preconceito, mas sim por
"pósconceito". Na década de 80 e 90 teve muita banda brasileira de Metal
com vocalistas que tentavam imitar a fonética inglesa e estadunidense cantando
em português. Era forçado demais. Soava estranho e, pra piorar, insistiam em
temáticas clichês ocultistas, satanistas, com incitação ao assassinato e coisas
do tipo: energia ruim. Já as bandas de Metal da Argentina, mesmo no início da
década de 80, já cantavam em espanhol sem ficar algo forçado e chato, com mais
criatividade e maior qualidade técnica.
Inacio:
O Metal veio de fora e é natural que as pessoas vão atrás do que está fazendo
sucesso em outros países, sendo que essa galera toca em inglês, na sua maioria.
Nós decidimos nos propor ao desafio de provar que dava para fazer Metal em
português aqui no Brasil e com algum tipo de mensagem que as pessoas pudessem
refletir. Sabe, proposta, existe! Se a pessoa quiser procurar e dar uma chance,
estamos aí.
E
qual mensagem vocês procuram passar com suas letras?
Inacio:
Sobre as letras que eu escrevi posso dizer que vieram de inspirações distintas,
experiências que presenciei e leituras que fiz sobre alguns padrões,
especialmente sociais... Eu procuro abrir um espaço maior pra discussão de
idéias...
Maurício:
O Ministério fala sobre as coisas da vida... e da morte. Do espírito também. A
indignação com as injustiças arde muito mais quando elas acontecem conosco. Eu,
Inácio e Carlos já passamos por muitas situações de repressão por sermos como
somos, e eu gosto de pensar que o que escrevo representa um manifesto, uma
resposta, uma tese para esfregar na cara de quem oprimiu a nossa laia. Gostaria
que as letras ajudassem na luta contra a crise cultural, mas também podem ser
somente devaneios paralelos.
Vocês
disponibilizaram “Abismo” digitalmente em diversas plataformas, inclusive
música por música individualmente. Claro que hoje em dia é essencial estar em
paralelo com o mundo virtual. Mas qual a opinião de vocês em relação a essas
plataformas e este novo formato de consumo de música? Quais as vantagens e
desvantagens?
Inacio:
As
vantagens são óbvias se considerar a abundância de material e facilidade de
acesso. As desvantagens são as propagandas irritantes e incessantes. A verdade
é que a mídia física já seguiu o caminho do vinil: virou artigo de
colecionador.
Lá
se foi um ano do lançamento do EP. Como vocês vêem o disco atualmente e qual a
repercussão de “Abismo” entre a mídia e o público?
Inacio:
Recebemos críticas positivas de “Abismo”. As pessoas entram em contato direto com
a banda via Facebook para comentar também e isso é excelente. É claro que o
aporte de divulgação ainda é muito menor do que queremos, mas chegaremos lá um
dia.
Maurício:
Nós, da banda, ainda estamos afundados nesse “Abismo”, no bom sentido.
Logicamente nos orgulhamos de todo o esforço e empenho, mas o melhor ainda está
por vir. Gostaríamos de mais oportunidades de mostrar nosso trabalho para um
público maior, mas admitimos que permanecemos na mendicância cultural. Quem
ouviu, deu uma chance, gostou.
Há
algum tempo a banda está preparando o DVD “Por Bares e Becos”. Por que a banda
optou por já lançar um material neste formato e o que o trabalho irá trazer?
Maurício:
Ao vivo é mais energético, mais legal.
Aliás,
há quantas andas o processo de produção do DVD e qual é a previsão de
lançamento do mesmo?
Maurício:
Sem previsão ainda, mas esse show que fizemos em Osasco em 2015 está gravado,
foi irado, e é um registro fantástico. Infelizmente, o governo usou a crise
atual para justificar o corte de verbas para o Ministério da Discórdia...
Por
fim, qual é a dessa de “Black Sabbath brasileiro”? Não é muita responsabilidade
não? (risos)
Maurício:
Não somos dignos. Na verdade quem começou foi o Roberto Bíscaro, que publicou
um artigo dizendo que éramos discípulos do Sabbath... Mas não podemos negar que
ficamos muito felizes com a comparação, afinal somos todos fãs. Sonho com o dia
em que serei convidado pelo Iommi para cantar, mas não esperarei sentado
(risos).
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