terça-feira, 10 de novembro de 2020

In Lo(u)co: Música a contragosto


Por Adaberto Belgamo

Numa noite de insônia (mais uma – risos), fiquei “bizoiando” os grupos e/ou comunidades relacionadas à música nas reses sociais. Uma postagem, repetida em vários grupos, chamou a atenção, pois envolvia a opinião do Rob Mito (esse sim! O outro é apenas um limítrofe cognitivo) Halford sobre o Kurt Cobain.

Ele dissertava sobre a importância do Kurt  (e do Nirvana) e o colocava entre as grandes personalidades do universo do Rock & Roll. Rob falou besteira? Não! Na realidade, nunca fala! Ele viveu as “mutações culturais” das décadas de 60, 70, 80 e 90 e, portanto, tem autoridade para falar sobre o assunto.

Música, como qualquer outro tipo de arte, não é linear e, por exemplo, como há as escolas literárias, o Rock - em especial - também tem seus gêneros. Como acontece no mundo dos livros, um movimento se sobrepõe ao outro, introduzindo novas perspectivas. O Realismo negava o Romantismo e assim por diante. Não é diferente no universo do Rock & Roll.

Independente do alcance de público, um estilo “nega” o outro. O Heavy Metal veio para negar toda a geração paz e amor, pois vinha diretamente da classe trabalhadora, que tinha (tem) de lidar com um dia a dia não tão colorido. Apesar de em alguns momentos as temáticas serem as mesmas (protestos, por exemplo, contra a corrida armamentista), musicalmente – mesmos usando elementos iguais – apontou outros caminhos.

O movimento Punk apareceu para sacudir o cenário, que era fortemente ocupado pelas bandas de Rock Progressivo. Alegavam que o Rock perdera a essência rebelde, quando se associou à música erudita e ao Jazz.

 

Iron Maiden, um dos principais representantes da NWOBHM

A NWOBHM foi de certa maneira uma resposta ao movimento Punk, regatando o Metal clássico britânico. É interessante salientar que “tecnicamente” ela se afastava do Punk, mas também não se associava ao Progressivo, limitando inclusive a duração das composições. Era ao mesmo tempo técnica – para os padrões da época – e visceral. Aproveitou, então, o que havia de melhor tanto na rebeldia Punk, como na “tecnicidade” progressiva.

A década de 80 foi marcada, principalmente nos EUA, pelo Hard Rock, tanto que houve tentativas de bandas européias em se “enquadrar” na nova onda. O tema merece uma discussão mais profunda em outro momento, mas, por enquanto, podemos dizer que a “atmosfera” não foi alcançada. A música (a arte em geral) é influenciada pelo ambiente cultural e sócio-econômico e, também, por incrível que pareça para alguns, o próprio clima é relevante. Não dá para falar em garotas na praia vivendo no fog londrino (risos).

De onde veio a resposta ao Hair Metal? Da mesma Califórnia ensolarada. Surgiu, então, o Thrash Metal, que bebeu nas fontes da NWOBHM e do Punk/Hardcore. Apesar de não ter o mesmo apelo “comercial” do antecessor, o estilo se firmou e de certa maneira ajudou a enfraquecer o festival de cabelos platinados (risos).

 Motley Crüe e seu Hair Metal


Chegando aos anos 90, as bandas de Seattle (Grunge para alguns) apareceram e chacoalharam a cena musical, além de expor liricamente as angústias do “cara comum”, que não se enquadrava nem no universo do Hard Rock, ou na “rigidez” do Metal. Finalmente, expuseram um EUA que não – parafraseando o Wander Wildner – conseguia ser feliz o tempo todo.

Finalmente, após 20 anos, havia um estilo, que conseguia dialogar com um público maior, que não era restrito aos costumeiros nichos e, acima de tudo, resgatar – mais uma vez – a crueza do Rock, além de beber em várias fontes musicais. Das bandas de garagem com os pedais de Fuzz no “talo”, revisitando Rock Clássico e a Psicodelia, passando por vários estilos, inclusive o Metal. No entanto, o mais importante, falava de coisas reais do dia a dia. Não que letras sobre dragões, terras mágicas e catástrofes sejam ruins, mas não representavam – apesar das metáforas – a realidade de então.

 

O Exodus insultava o Hair Metal  no início de carreira


E onde entra o Rob ‘Mito’ Halford em tudo isso? Um movimento musical e comportamental necessita de um catalisador. Uma banda ou alguém que represente a mudança ou apresente uma nova realidade comum, tirando as pessoas das “bolhas”.

Logicamente, há a questão da indústria ($$$) e da boa vontade ($$$) da mídia,  mas sem a “arte” nada acontece. Na declaração, Rob coloca o Kurt ao lado de ícones da música ocidental, em especial do Rock & Roll e suas vertentes (risos). A importância dele e do Nirvana é a mesma que tiveram, por exemplo, Hendrix, Elvis (apesar das controvérsias – risos), Joplin, Morrison, Amy e tantos outros desde o  final da década de 40 do século passado. Em suma: ele catalisou uma geração toda, alavancando outras bandas e criando uma identidade coletiva.

 

Alice Chains, um dos grandes representantes do Grunge

Reflitam: com exceção do Britpop (reposta britânica à “invasão” americana nos anos 90), o que surgiu com a mesma importância, representada pela figura do Cobain? Dei aulas de 1993 a 2017. Nas minhas turmas com aproximadamente 30 “malas” (risos), até o final dos anos 90, havia praticamente 1/3 de fãs ou interessados em Rock. No século XXI, se encontrasse um aluno por turma, era muito.

O Rock e o Metal chegaram ao fim? Não! Muito pelo contrário! Estão vivos no underground (como sempre) e vez ou outra ocupam lugar de destaque. Assim como não morreram a música erudita, o Jazz e o Blues, o estilo continuará firme, com menos exposição midiática, mas sobrevivendo bem.

“N” motivos podem ser apresentados para justificar o protagonismo, que em outros momentos o estilo teve. Interesse da indústria – que “conseqüentemente” leva ao interesse da mídia -  e um deles, mas o mais “letal” está entre os apreciadores do gênero, principalmente na seara do Metal, que “espantam” possíveis fãs.

 

Mas é outra história...

 

Inté!

 

*Adalberto Belgamo é professor, atuando no museu (sem ser peça... ainda - risos), colaborador do Arte Metal, além de ser Parmerista, devorador de música boa, livros, filmes e seriados. Um verdadeiro anarquista fanfarrão.

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