Por Vitor Franceschini
Completando quase 8
anos de carreira, a banda Arandu Arakuaa vem conquistando cada vez mais espaço
não só no cenário metálico nacional, mas também em centros que apoiam a cultura
brasileira de uma forma geral. Afinal, seu segundo álbum “Wdê Nnãkrda” (2015)
reforça o que a banda se propôs a fazer, isto é, Metal mesclado com música indígena/folclórica
brasileira e atingiu diferentes públicos. Zândhio Aquino
(guitarra/vocal/viola/teclado e instrumentos típicos indígenas) conversou com o
Arte Metal e falou um pouco mais do Arandu Arakuaa, de seu novo álbum e outros
assuntos que circundam a banda. Completam esse time NáJila Cristina (vocal), Saulo
Lucena (baixo) e Adriano Ferreira (bateria).
Bom,
como esta é a primeira entrevista para o Arte Metal, gostaria que você contasse
como surgiu essa ideia e interesse em fazer Metal se utilizando de elementos e
temáticas indígenas?
Zândhio
Aquino: O conceito do Arandu Arakuaa está intimamente
ligado com o lugar onde nasci e morei até os 24 anos de idade, nas proximidades
da Terra Indígena Xerente no estado do Tocantins. Desde cedo fui agraciado
pelos espíritos dos meus ancestrais com o dom da arte, em especial de compor
músicas e chegou um momento em que notei que precisaria usar esse dom para
honrá-los e a favor da nossa luta. Onde eu morava era praticamente impossível
encontrar músicos para um projeto como esse, vim pro Distrito Federal e aqui
encontrei meus parceiros de banda que também estavam prontos para darem sua
contribuição e decidimos fazer isso sendo parte de uma cena que amamos que é o
Metal.
Desde
quando você estuda o tema e qual metodologia você utiliza, enfim, você sempre
está buscando conhecer mais esse tipo de cultura?
Zândhio:
Na
criação das músicas raramente existe um estudo direcionado, a composição de uma
música é sempre a tentativa de materializar e eternizar um momento de
inspiração. Sobre culturas indígenas é algo que faz parte de mim, sempre tenho
interesse em conhecer mais e mais e consequentemente isso deve aparecer em
nossa música.
Partindo
para o novo trabalho “Wdê Nnãkrda”, como foi o processo de composição do disco?
Houve alguma mudança na forma de compor em relação ao primeiro disco?
Zândhio:
No “Kó Yby Oré” (2013) compomos apenas em tupi, no “Wdê Nnãkrda” compomos
também em xerente, xavante e uma música em português, aliás, o CD todo é muito
influenciado pelas culturas dos Povos Indígenas do Cerrado Brasileiro, em
especial os Xerentes. A diversidade de idiomas indígenas visa chamar atenção
para preservarmos as riquezas que ainda temos, dentre elas as línguas que ainda
resistem e as que carecem serem preservadas. Eu diria que esse disco foi muito
bem pensando e também existia uma motivação muito grande após o sucesso do “Kó
Yby Oré”. Na verdade antes do “Kó Yby Oré” ser gravado eu já sabia exatamente o
que queria liricamente e musicalmente para o próximo disco e meio que pirei
nisso, queria muito mais elementos indígenas e ir mais fundos nos ritmos e
harmonias de música brasileira. Acho que isso até assustava um pouco meus
colegas de banda, mas quando o processo começou a rolar de fato, todos deram o
sangue e estão orgulhosos da cria. Importante também mencionar o trabalho do
Caio Duarte, além de ser um produtor e músico fantástico, é também um grande
amigo e entusiasta do projeto.
Aliás,
na questão musical e também num aspecto geral, qual a principal diferença do
novo disco em relação ao debut “Kó Yby Oré” (2013)?
Zândhio:
“Kó Yby Oré” tem músicas compostas entre 2003 e 2011, aquela coisa de primeiro
disco mesmo. E por mais complexo que ele seja do ponto de vista musical ainda
assim soa urgente e na cara. “Wdê Nnãkrda” é um disco bem mais climático e com
arranjos mais elaborados: mais vocais limpos; mais cânticos indígenas; diversos
instrumentos indígenas; mais viola caipira; mais elementos percussivos; e na
parte que entra o Metal fica realmente muito pesado. Foi gravado de forma mais
orgânica e com esse clima de música indígena permeando por todo o disco.
Até
então o novo trabalho é o ápice do Arandu Arakuaa?
Zândhio:
Sim. É a continuidade e evolução natural do nosso trabalho.
Mesmo
trazendo mais elementos da música indígena e folclórica brasileira, “Wdê
Nnãkrda” soa ainda mais pesado em seus momentos Heavy Metal. A banda se
preocupou com essa mescla ou foi algo que surgiu naturalmente?
Zândhio:
Surgiu
naturalmente, talvez soe mais pesado devido à nossa evolução técnica.
Matheus Nachtergaele durante a apresentação da banda no Thorhammerfest |
O
disco leva o ouvinte a uma viagem musical, ou seja, é um estágio difícil de
alcançar fazendo apenas música. Fale um pouco sobre isso, sobre esse tocante da
sonoridade da banda.
Zândhio:
A grande maioria das músicas desse disco foi composta apenas com voz, viola
caipira e instrumentos indígenas. Essas ideias geralmente surgiam quando eu
tinha algum contato com a natureza ou bem cedinho quando a cidade ainda estava
silenciosa. Eram momentos de total comunhão com os espíritos da natureza e isso
não se perde nem nos momentos onde o caos da sonoridade do Metal impera. Também
durante o processo de gravação nos preocupamos em dar um caráter bastante
emocional às interpretações, enfim, tentamos seguir à risca a estética da
música. Talvez por esse motivo o disco esteja sendo muito bem aceito por
indígenas e praticantes de xamanismo.
Impressiona
como a vocalista Nájila está cada vez melhor. Como foram desenvolvidas as
linhas vocais do disco?
Zândhio:
A Nájila tem um timbre de voz muito bonito e único, pode cantar até música ruim
que vai soar foda (risos). Quando ela entrou na banda abraçou essa ideia e
pressão de cantar usando diferentes técnicas e de lá pra cá só vem evoluindo
mais e mais. Quando vou compor começo quase sempre pelos vocais, os arranjos do
instrumental são elaborados de forma que a voz possa soar forte. Nesse disco
passei a cantar mais, a ideia era além de ter mais presença de cânticos
indígenas também dá algum espaço pra Nájila respirar, já que as partes vocais
exigem bastante dela ao vivo. Pesa também a nosso favor o fato do produtor Caio
Duarte ser um dos melhores vocalistas do Brasil.
A
música Hêwaka Waktû foi escolhida
para o videoclipe. Por que a escolha, como foi e qual a importância a banda vê
em trabalhar num vídeo?
Zândhio:
Compus a letra dessa música no final de 2013 quando fui visitar amigos na Terra
Indígena Xerente, em Tocantins e a parte instrumental composta em uma região
próxima ao Pantanal, em Mato Grosso do Sul. Ela fala sobre chuva justamente
porque chovia bastante nos momentos em que foi composta. Chovia bastante também
durante todo o processo de gravação do disco, parecia um sinal. Durante o
processo de gravação o Caio Duarte também já ia dando ideias pro conceito do
vídeo e íamos pirando juntos (risos). Nossas músicas têm essa ligação forte com
a mãe terra, então tentamos também através dos vídeos despertar as pessoas para
que voltem a se re-conectem com a natureza. Temos também a preocupação com a
qualidade técnica, sempre queremos dar nosso melhor. Nosso público é exigente e
sempre esperam que nos superamos a cada videoclipe.
E
como está a repercussão de “Wdê Nnãkrda” tanto por parte da crítica, quanto por
parte do público?
Zândhio:
Está sendo ótima, até agora não vi ninguém falando mal. Com esse disco também
ampliamos nosso público fora do Metal, em especial o público indígena.
A
banda participou de um dos episódios da série sobre a vida e obra do lendário
Zé do Caixão. Como se deu e como foi participar dela?
Zândhio:
O diretor da série já conhecia nosso trabalho e entrou em contato comigo, foi
algo simples e direto. A gravação rolou em abril deste ano durante a
apresentação da banda no festival Thorhammerfest em São Paulo – SP, com o ator
Matheus Nachtergaele (o eterno João Grilo de “O Auto da Compadecida”) subindo
ao palco para sua personificação do nosso lendário Mojica. O episódio foi ao ar
em dia 18 de dezembro de 2015 no canal de TV Space. Foi uma grande honra e conquista pra nós
sermos parte de um momento tão importante do cinema e da televisão brasileira.
Quais
os planos para 2016, há algo que vocês possam nos adiantar?
Zândhio:
Divulgar ao máximo o “Wdê Nnãkrda”, tocar ao máximo tanto em eventos de Rock/Metal
quanto de cultura indígena e seguir compondo para o próximo disco.
Muito
obrigado pela entrevista. Podem deixar uma mensagem aos leitores.
Zândhio:
Só temos a agradecer ao Arte Metal por mais uma vez abrir espaço para falarmos
sobre nossa música. Agradecemos imensamente também a nossos amigos que nos apoiam
diariamente. Não tem essa de fã versus músico aqui, somos todos parte da
comunidade Metal e estamos nessa por amor e pra divulgar e exaltar nossa
cultura raiz.
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